Parece-me que estou num mundo à parte e que vivo numa realidade paralela. Sim, sinto-me assim em meio a toda movimentação de retorno às aulas presenciais e sem, digo sem, vacina para a população, neste momento, exceto para os primeiros grupos, conforme tabela de vacinação organizada em fases.
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Explico: a rede municipal de educação de Porto Belo/SC retorna às atividades presenciais com os estudantes a partir do dia 17/fev. Organizam-se as escolas e as salas de aula para recebê-los, depois de tanto tempo, com turmas divididas em dois grupos (50% dos estudantes em cada grupo): numa semana, um grupo tem aula presencial; e, na outra semana, o outro grupo tem aula presencial. Além disso, ainda há a possibilidade do ensino remoto para as famílias que não quiserem enviar seus filhos à escola, modalidade a ser ministrada por professores que integram o grupo de risco e, com laudo médico, mantêm-se protegidos em suas casas.
A notícia deveria ser animadora, pois, após mais de 10 longos meses, retomamos as atividades escolares e estamos todos nós, professores, com saudades daquilo que sabemos fazer de melhor: estar em contato com o conhecimento e com os estudantes, dentro de uma escola, interagindo, compartilhando, aprendendo e buscando formas de nos colocarmos no mundo, diariamente. Mas, a notícia não é positiva, a meu ver.
As angústias pelas quais passamos ao longo de 2020, adequando-nos ao ensino remoto, ao distanciamento social, à realidade com o vírus da covid-19, ao trabalho com nossas crianças e adolescentes através de telas, entre tantas outras coisas não enumeradas aqui, acumulam-se com mais angústias a partir do momento em que houve o decreto do governo do estado de Santa Catarina, passando as aulas presenciais para atividades essenciais (portaria divulgada em 08/dez./2020), e a partir do chamamento para o trabalho presencial, no final de janeiro/2021, por parte da Secretaria de Educação de Porto Belo. São angústias porque já temos tantos exemplos de lugares (municípios, estados ou redes particulares) em que as aulas presenciais foram retomadas e houve surtos de contaminação, falando unicamente de Brasil, pois, como se sabe, estamos em meio à segunda onda de disseminação do vírus, com casos diários alarmantes.
Como professores, tenho certeza de que sempre primamos pela segurança, pelo conforto, pela tranquilidade de nossos estudantes. Porém, não podemos fornecer nada disso, neste momento, já que estaremos confinados dentro de salas de aula – sim, porque a estrutura de pátio não permite aulas ao ar livre –, com distância mínima de 1,5 m entre um e outro, sem podermos nos tocar, abraçar, acolher o colega, a criança ou o adolescente. E paira no ar o vírus a nos rondar...
Na formação pedagógica para os professores, ocorrida na semana de 08 a 12/fev./2021, muito foi ouvido sobre como proceder, o que fazer, qual direcionamento seguir, mas pouco foi discutido sobre quando seremos vacinados, com que frequência seremos testados – nós e os estudantes –, já que o teste está sendo fornecido agora antes da retomada, mas não sabemos quando será efetuado novamente, ou se ocorrerá a cada novo dia de entrada nas escolas, se teremos material de proteção individual disponibilizado, se a escola será limpa/sanitizada a cada final de turno – porque vale lembrar que a quantidade de servidores para este trabalho também é limitado e não deveria, jamais, ser sobrecarregado –, enfim. Em relação a tudo o que nos foi passado, na formação que mencionei, é importante destacar que olhar o contexto do estudante, analisar suas habilidades individuais, considerar que cada um é único, ímpar, completo e tem a aprendizagem nivelada em comparação a si mesmo, nunca aos demais, proceder com avaliação diagnóstica: tudo isso já se faz desde 2014, com a implantação do plano Nacional de Educação, ou muito antes, em tantos locais, com base em grandes teóricos da Educação.
Então, a maior de todas as angústias é: enquanto campo da Educação, retornamos mesmo igual – ou pior – em relação ao que era antes? A pandemia não nos ensinou nada?
Em outros momentos de peste, ao longo da História, as alternativas usadas foram aulas fora de espaços fechados, valorizando a liberdade e a autonomia de cada estudante. Em pleno século XXI, regrediremos nos ensinamentos que outros sujeitos, que vieram antes de nós, nos passaram de sabedoria?
Não sei se tem lógica – sou da área de Letras e não fiz os cálculos ou as estáticas para afirmar algo, apenas intuí –, mas fico me questionando se usar o dinheiro da adaptação das escolas para o retorno presencial agora e redirecioná-lo para uma vacinação em massa, aguardando o período (curto) de imunização, não seria melhor? Preservar todas as vidas não deveria ser a premissa maior? Colocar profissionais e estudantes em risco de contágio não é uma ação, no mínimo, desumana?
Sinto-me, portanto, num mundo à parte, já que, em minha realidade, o vírus atinge pessoas cotidianamente, deixando algumas com sequelas graves, as quais serão levadas pra vida e, quem sabe, esses indivíduos precisem conviver com as mesmas até que novas descobertas da Ciência possam ser efetivadas – ou não! A meu lado, ouço notícias de surtos em escolas, de locais com bandeira vermelha restringindo mais e mais a movimentação da população, e de hospitais com lotação alta, por conta de infecção pelo vírus.
Desta forma, destaco minha decisão de não compactuar com essa forma de trabalho, obrigando o retorno das atividades presenciais, principalmente aos professores que não integram o grupo de risco.
Referência: GAROFALO, Débora. 5 dicas para replanejar... 2020. Disponível em https://www.uol.com.br/ecoa/colunas/debora-garofalo/2020/06/24/5-passos-para-replanejar-suas-aulas-durante-e-pos-pandemia.htm. Acesso em 13 fev. 2021.
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